O Que é Sociologia, de Carlos Benedito Martins


FICHA TÉCNICA

2006 / 100 pág. / São Paulo

Autor: Carlos Benedito Martins

Editora: Brasiliense

Catalogação bibliográfica: Sociologia

ISBN: 85-11-01057-2


Apresentar a sociologia a partir do seu surgimento, formação e desenvolvimento é o objetivo desta obra. O autor do livro, Carlos Benedito Martins, logo na Introdução, ressalta que será a partir de contextos e fatos históricos que a obra se desenvolverá, destacando o “princípio de que a sociologia é o resultado de uma tentativa de compreensão de situações sociais radicalmente novas, criadas pela então nascente sociedade capitalista" (p.08).


Desse modo, apresenta as diferentes interpretações sobre a sociologia e seu papel na sociedade, seja interpretada como arma a serviço dos interesses dominantes ou como expressão teórica dos revolucionários e de seus movimentos.


No primeiro capítulo, O surgimento, o autor define o contexto histórico do nascimento da sociologia como parte da ruptura do geocentrismo para o heliocentrismo, influenciada pela eclosão das ciências a partir do pensamento moderno e do método científico especializado, assim como pela queda do feudalismo com suas instituições e apogeu do capitalismo, tornando-se o sistema vigente. Correntes filosóficas como o Racionalismo e o Iluminismo, assim como as revoluções Industrial e Francesa, causaram mudanças econômicas, políticas e culturais na sociedade da época, e deste modo, cada vez mais o fato social constituia-se em “problema” e “objeto” que deveria ser investigado. Assim, as novas transformações advindas da indústria e do capitalismo, assim como a necessidade em desarticular o feudalismo, aproximou os intelectuais do método científico experimental, questionando a teologia e contrariando os parâmetros naturais fundamentados em dogmas, autoridade e concepção providencialista.


A ideia inicial de que o social é o resultado de uma construção coletiva supera rapidamente o campo filosófico e científico a partir de inúmeras literaturas que surgiam, formando uma compreensão e consciência popularizada em toda a sociedade da época sob a concepção de que “o processo histórico possui uma lógica passível de ser apreendida [...] um acontecimento que abria novas pistas para a investigação racional da sociedade” (p. 19).  Abolindo radicalmente a antiga forma de sociedade, esta compreensão eliminou as instituições inimigas da liberdade e com isso limitou o poder patriarcal (nas famílias) e da Igreja (confiscando propriedades e passando o controle da educação para o Estado, antes sob aval do clero).


A primeira compreensão crucial sobre o surgimento da sociologia trata-se dela enquanto fenômeno revolucionário da burguesia e seus intelectuais frente ao feudalismo e suas instituições, preservando uma postura crítica e negadora; a segunda, dá-se após a burguesia assumir o poder e criar novas instituições, abandonando os ideais racionalistas e iluministas por uma postura que busca preservar e manter a ordem social do novo sistema. Por isso, a sociologia neste cenário será positivista e pensada fora daquela crítica negadora fomentada pelo projeto racionalista e iluminista durante os conflitos iniciais entre burguesia e feudalismo, assim como distante da economia política, isto é, teorizando um objeto social autônomo e, como afirma Martins, independente dos fenômenos econômicos.


Em vista disso, esta primeira sociologia não será uma crítica ao capitalismo burguês, ou seja, não será nela que o proletariado encontrará um referencial teórico, mas “no pensamento socialista, em seus diferentes matizes, que o proletariado, esse rebento da revolução industrial, buscará seu referencial teórico para levar adiante as suas lutas na sociedade de classes” (p. 33).


Em A formação, título do segundo capítulo, Martins investiga a sociologia a partir da noção de formação. Destarte, questiona num primeiro momento as afirmações que tentam desconsiderar os resultados que a sociologia alcançou desde seu nascimento e ressalta as divergências, falta de entendimento comum e debates do sociólogos em torno da mesma, assim como a relação entre esses conflitos e os antagonismos de classe presentes na formação da sociedade. Ou seja, o diagnóstico apresentado pelo autor destaca que grande parte das discordâncias em torno da sociologia, seu objeto e métodos, dá-se pela “existência de interesses opostos na sociedade capitalista” (p. 35).


Assim sendo, a sociologia foi influenciada pelas alternativas históricas e suas narrativas, refletindo diretamente no conteúdo político da mesma. Os conflitos causados pelos antagonismos de classe e suas divergências originaram várias tradições sociológicas, dentre elas, os conservadores, positivistas e socialistas são os protagonistas centrais.


Os conservadores ou “profetas do passado” condenavam as ideias iluministas e defendiam a manutenção da ordem vigente, também consideravam os impactos causados pelas revoluções (fundamentadas pelo iluminismo e racionalismo) um castigo divino à humanidade; os positivistas (Saint-Simon, Auguste Comte e Émile Durkheim) buscaram ideias nos conservadores para a defesa dos interesses da burguesia (capitalismo), assim como para oferecer um método científico à sociologia, focado na neutralidade, imparcialidade e objetividade; os socialistas (Marx e Engels), por outro lado, procuraram "realizar uma crítica radical” ao sistema capitalista, “colocando em evidência seus antagonismos e contradições” (p. 51). O socialismo marxista surge da junção entre o socialismo, a dialética e a economia política, à vista disso, pretende ser uma crítica radical da sociedade e contrariar tanto os positivistas como os conservadores, que preservaram uma visão conformista sobre as estruturas sociais vigentes. Além do socialismo marxista, há o pré-marxista que é chamado de “socialismo utópico”, pois não tinha um caráter científico em suas ideias, sendo resultado das reações contra o capitalismo, mas sem pontos específicos de crítica contra o mesmo, voltados para os interesses da humanidade como um todo, ignorando as classes sociais com seus interesses, antagonismos e contradições. O socialismo marxista, ao notar esta falha, buscou superá-la por vias críticas específicas, em outras palavras, por via do materialismo histórico.


Neste cenário de formação, Max Weber é posto como o responsável pela reputação científica conferida à sociologia. Ao discordar de seus predecessores em alguns pontos, em especial de Marx, buscou delimitar a fronteira entre o cientista e o político (o homem do saber, das análises dos fatos) do homem político (das ações e comprometido com as questões práticas da vida), todavia, criticou o positivismo por tornar o pesquisador um mero registrador de fatos e informações, defendendo “um papel ativo na elaboração do conhecimento” (p. 66), assim como deu à religião um lugar de destaque em suas preocupações e trabalhos.


No último capítulo, o autor oferece um panorama geral d’O desenvolvimento da sociologia, evidenciando o distanciamento do projeto de igualdade e fraternidade pela burguesia, de maneira que a utilização das ciências sociais torna-se parte do conhecimento útil e necessário à dominação vigente. Não obstante,  inúmeras pesquisas e trabalhos, influenciados ou não pelos clássicos da sociologia, continuaram a surgir, isto é, as divergências que pairavam em torno do objeto sociológico desde seu surgimento continuam presentes e, deste modo, a luta entre conservadores e revolucionários preserva seu caráter antagônico.


Após as duas guerras mundiais, a sociologia desenvolveu-se de forma vertiginosa na sociedade norte-americana, assim como ocorreu a institucionalização da sociologia e profissionalização dos intelectuais da mesma, fortalecendo “ uma atitude ‘neutra’ e ‘objetiva’” (p. 89). Conquanto, surgem nomes de grande relevância para o desenvolvimento sociológico, tais como Max Schiller e Karl Mannheim (e a “sociologia do saber”), Universidade de Chicago e suas investigações de campo (fortalecendo o levantamento de dados empíricos), Escola de Frankfurt e seus representantes (Korsh, Lukács, Adorno, Horkheimer, Marcuse), entre muitos outros intelectuais, escolas, instituições e universidades.


Portanto,  concluímos a partir deste rápido garimpo pela obra que trata-se de um trabalho rico em informações e análises. Uma obra recomendada a todos que buscam adentrar horizontes e pistas para aprofundar sua visão sobre as relações que interligam sociologia, economia, política, religião, cultura, entre outras áreas.


Comentários

Postar um comentário