Sussurros do Coração, de Yoshifumi Kondō


FICHA TÉCNICA

1995 / 111 min / Japão

Direção: Yoshifumi Kondō

Estúdio: Studio Ghibli 

Gênero: Animação, anime, drama, família, 

musical, romance


A obra Susurros do coração é uma animação simples, mas com extrema elegância e sutis contornos reflexivos. É um filme voltado para os dilemas da adolescência e seus ritos de passagem para a vida adulta (vida escolar, romances, amadurecimento, etc), além de fazer uma discreta crítica ao forte processo de urbanização que deu-se início com a chegada das novas tecnologias industriais.


O enredo é desenvolvido a partir da jovem Shizuku Tsukishima e do jovem Seiji Amasawa. Ela é uma garota que adora livros e sonha ser escritora; enquanto ele dedica-se à construção, restauração e manutenção de violinos e planeja ir estudar no exterior com o firme objetivo de tornar-se um artesão habilidoso.


A crítica ao processo de urbanização (industrialização) das cidades é feita sempre por meio de situações musicais, isto é, a crítica é expressa a partir da canção Country Roads, de John Denver, na qual o cantor-compositor expõe uma saudade de casa ao afirmar que apenas as estradas do campo podem levá-lo para lá, deixando subentendido que trata-se da súplica de um homem do campo que vive no meio urbano, mas que encontra-se angustiado com saudade do contato com a natureza e suas belezas naturais.


O ponto de tensão entre o urbano e o rural pode ser melhor compreendido – principalmente no contexto japonês – a partir das pontuações feitas por Ernani Oda (2017, p. 52-56) que apresenta algumas questões relacionadas ao processo de urbanização japonês, destacando o fato de os produtos culturais (animes, músicas, mangás, etc.) serem influenciados por tais transformações, pois os mesmos são influenciados por sentimentos como a alegria, raiva, tristeza, solidão, etc.


Assim sendo, Ernani Oda busca investigar em correntes sociológicas japonesas os fenômenos causados pela relação entre o processo de urbanização e a formação da cultura popular, além de provocar relevantes reflexões sobre o processo de “transição de uma perspectiva que idealiza o mundo rural para uma perspectiva que idealiza o mundo urbano” (ODA, 2017, p. 57). E, de fato, claramente fica evidente que essas pesquisas são úteis para examinar estes mesmos fenômenos culturais em outros países que também passaram pelo mesmo processo de transição; talvez seja por isso que Yoshifumi Kondō escolheu a canção Country Roads, pois trata-se de uma canção estadunidense, mas que também expressa exatamente os sentimentos provocados pelo processo de transição do rural para o urbano, processo que todo país passou ou que ainda passa em muitos locais que resiste à urbanização do rural.


É importante destacar que o filme de animação expõe duas perspectivas de transição: 1ª) a transição do rural para o urbano, que também implica nas “ondas migratórias de pessoas deixando suas vilas para tentar a sorte nas cidades, especialmente na capital, Tóquio” (ODA, 2017, p. 57); e a transição da fase juvenil para a vida adulta com seus ritos de passagem. Estas duas perspectivas de transições podem ser notadas tanto quando a canção Country Roads aparece na obra, tal como na decisão do personagem Seiji Amasawa que opta por ir estudar na Itália (exterior).


A lição mais importante que deve-se frisar ao considerar as colocações aqui expostas – provocadas pelo enredo do anime – é compreender a impactante constatação de que “a ideia de urbanização atua, portanto, como conceito central na articulação entre a dinâmica das manifestações culturais e a realidade social em que elas se desenvolvem'' (ODA, 2017, p. 57).


Portanto, o filme Sussurros do coração é uma obra rica em questões sociológicas que vai desde as transformações socioeconômicas até a correlação de tais transformações com as inquietudes existenciais do coração humano que influenciam o processo de formação das criações culturais, além de destacar o processo individual em busca de autoconhecimento, amadurecimento afetivo e intelectual, social,  familiar, entre outros. 


REFERÊNCIAS


ODA, Ernani. Experiência urbana e diferença geracional na formação da cultura popular japonesa. Estudos Japoneses, n. 38, p. 52-66, 2017. Disponível em: clique aqui. Acesso em: 02 de jan. 2022. 


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